Eduardo Borges. pesquisador doutorando do LAPES
25 mil bolsas foram disponibilizadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para o período entre Agosto de 2020 e Julho de 2021. Elas serão oferecidas no âmbito do Programa Institucional de Iniciação Científica (PIBIC) por meio de chamada pública para Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICTs) e Instituições de Ensino Superior (IES), públicas e privadas.
O ponto mais destacado do anúncio é a prioridade concedida a algumas áreas do conhecimento. O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação (MCTIC), por meio das Portarias nº 1.122, de 19.03.2020 e nº 1.329 de 27.03.2020, especificou que pesquisas “científicas e tecnológicas” terão preferência.
Projetos de pesquisa básica, Ciências Humanas e Ciências Sociais só seriam contemplados por bolsas do PIBIC caso contribuam, em algum grau, para o desenvolvimento das Áreas de Tecnologias Prioritárias do MCTIC. Assim, pesquisas nessas áreas que foquem em outros temas deverão ser desenvolvidas com recursos próprios dos pesquisadores ou das Instituições de Ensino. Como se sabe, a distribuição social dos estudantes varia muito com as áreas. Sendo assim, a medida tende a atingir justamente estudantes de menor renda e que, sem bolsas, não poderiam ter acesso à Iniciação Científica nem se dedicar a carga horária de 20 horas semanais, pois grande parte precisaria conciliar as disciplinas regulares de seus cursos e a pesquisa com inserção no mercado de trabalho. Sem o apoio financeiro ficaria inviabilizada a participação em atividades de Iniciação Científica.
A despeito das possíveis boas intenções da medida, esta aumentaria a desigualdade em cursos que, tradicionalmente, recebem maior quantidade de estudantes que necessitam de apoio institucional para inserção na comunidade acadêmica e científica. Além disso, ainda que não seja o objetivo do Ministério, a medida pode reforçar no imaginário social a hierarquização dos conhecimentos e áreas de estudo, colocando as pesquisas em Ciências Humanas e Sociais na base de uma pirâmide como se “fossem menos importantes” para o Brasil da mesma forma que seus estudantes e profissionais.
Além das contribuições econômicas e sociais das pesquisas em todas as áreas do conhecimento, vários trabalhos, indicam a importância das atividades extracurriculares para o combate à evasão discente na medida em que auxiliam os estudantes de graduação na formação de uma identidade profissional, incentivam o aprimoramento de conhecimentos e desejo de aprender e são uma forma de reduzir os prejuízos tanto do setor público como privado com a evasão discente. Várias gerações de pesquisadores e policy makers tiveram a IC como um ponto importante em suas trajetórias profissionais. Seria um enorme dano a milhares de estudantes que também poderiam contribuir mais para um Brasil melhor caso recebessem apoio.
É um equívoco definir a importância dos conhecimentos e áreas de estudo a partir unicamente de seus impactos na geração de “PIB” e lucro, pois conhecimentos nas áreas de humanidades e sociais (em todos seus campos de pesquisa) são relevantes para subsidiar formulação e implementação de políticas públicas no campo social e de assistência, Saúde, Educação, Cultura, Meio ambiente, dentre outras áreas estratégicas em qualquer país. Mais ainda num país que é marcado por imensa desigualdade e problemas sociais profundos. Sociedades mais educadas também podem crescer mais economicamente e tendem a ser mais estáveis.
Compreender como as sociedades se enxergam, os seus dilemas sociais e filosóficos, suas regras de sociabilidade, como os indivíduos administram suas vidas e costumes é essencial para a correta focalização das políticas públicas, e para o bem estar coletivo em sociedades livres e democráticas.
Além disso, os estudos nos campos das Ciências humanas e Sociais são importantes para a compreensão dos fenômenos sociais e humanos e auxiliam as sociedades na busca da resolução de seus conflitos sociais e individuais e na convivência harmônica. Valores e Instituições caros à sociedade ocidental como a Democracia e as Instituições que compõem o sistema econômico liberal não teriam sido possíveis historicamente sem as contribuições das humanidades e Ciências sociais.
O investimento nas áreas consideradas prioritárias é de fato essencial para o país que necessita de avanços em infraestrutura e produção de Ciência e Tecnologia. Isso não é negado por qualquer pesquisador ou estudioso com o mínimo de razoabilidade. Além disso, compreendem-se as dificuldades fiscais pelas quais o país passa. Porém, investir na compreensão de nossos problemas sociais e da dimensão subjetiva e humana da existência não é importante ou prioritário para o país? As humanidades também são de grande importância para a construção de uma sociedade harmônica, educada e com cidadãos que tenham consciência de sua História, da sociedade em que vivem e de si mesmos como indivíduos livres e como sujeitos de direitos e deveres.
#bolsaCNPq
Caro Professor Antonio Augusto Prates. Obrigada pelo comentário. Acho muito importante considerar as dimensões distintas que você destaca: o financiamento da pesquisa (e os critérios para priorização de uma ou outra área (dando atenção às áreas relevantes mas com poucos retornos econômicos) e o financiamento das atividades de formação, entre as quais se inclui o PIBIC. Acredito que, corretamente, você indica que atividade de formação merece investimento em todas as áreas de conhecimento.
O texto do Eduardo coloca pertinentemente a questão da priorização de áreas de conhecimento mas, a meu ver, o argumento elaborado para criticar a atual política das agências governamentais priorizando as áreas das exatas ou da natureza para investimento, pelo fato de apresentarem um retorno econômico mais visível, enquanto as ciências humanas impactaria o sistema cultural e politico, não toca no ponto fundamental do problema da politica de priorização do governo federal. A meu ver, a politica de priorização do gov. federal devia ser colocado de ponta-cabeça, ou seja, as áreas das exatas deveriam, se já não o fazem, buscar recursos junto ao mercado de financiamento e as politicas públicas governamentais deveriam priorizar aquelas áreas menos sensíveis às demandas d…
Contamos com você Greyssy
Parabenizo pelo artigo, pois é de suma importância repensarmos sobre os equívocos da hierarquização dos campos de conhecimento. Outro ponto que foi de grande destaque é a questão da bolsa de Iniciação Científica (IC) e sua participação na formação acadêmica dos estudantes de graduação. Nos faz refletir sobre o papel imprescindível da IC na permanência dos estudantes de menor renda. Esta leitura me atentou para várias questões e conceitos como a afiliação estudantil (Coulon, A. 2008) e a permanência material e simbólica (Santos, D. 2009) de estudantes no Ensino Superior, diante do nosso atual contexto de crise política, cortes drásticos no investimento na Educação e pandemia. Espero poder dialogar sobre o tema com o nobre colega e demais membros do…